Desculpem a quem isto não diz nada, mas é um bom exemplo de quem os tem no sítio...
Ex.mo. Senhor Director da FEUP:
Recebi, como todos os outros funcionários da FEUP os seus votos de Bom Natal e de um ano de 2006 cheio de sucessos o que me suscita sentimentos contraditórios. Devo agradecer os votos de Boas Festas, porque elas só dependem de cada um de nós e das nossas circunstâncias familiares; trata-se de uma delicadeza da sua parte e manda a boa educação que esses votos sejam correspondidos. Por outro lado tenho que rejeitar como hipócritas e perversos os seus votos de bons sucessos para o ano que se vai iniciar. Porquê? É simples. Os sucessos dependem antes de mais nada das hierarquias e como bem sabe (mas finge como de costume que nada se passa) há casos sucessivos de arbitrariedades, perseguições a pessoas, malfeitorias feitas a alunos para atingir docentes (é espantoso mas é verdade) e variadas outras ocorrências que são praticadas pela hierarquia criada dentro da FEUP, com o apoio pelo menostácito do CD e CC onde o senhor pontifica. Se não contaram com o seu apoio directo, pelo menos obtiveram o seu beneplácito implícito. E atreve-se ainda a desejar sucessos para o ano que se inicia? Não lhe dou esse direito. Vem desejar sucessos quando o crime de delito de opinião é punido, dentro de uma Universidade, com ostracismo e negação do acesso aos equipamentos de investigação, quando a possibilidade de ver projectos aprovados e de poder investigar são recusados, quando a calúnia e a difamação públicas passam impunes e o legítimo direito à progressão na carreira é negado? Está a brincar connosco? Julga que tudo pode ficar indefinidamente impune só porque é tratado(e nem sequer é preciso ser mosca para imaginar em que termos ...) em reuniões restritas? Não me venha pois com votos insinceros quando quer eu quer o senhor sabemos que chega a negar documentos a quem tem não apenas o direito mas o dever de se defender. Tivesse eu a formação jurídica adequada e poderia afirmar sem sombra para dúvidas que vários dos actos da governação da FEUP são ilícitos e devem portanto ter o tratamento adequado. Esta diatribe vale para toda estrutura directiva da FEUP mas é ao senhor que me dirijo porque os aparentes desejos de sucessos são seus, porque o poder dentro da FEUP é cada vez mais unipessoal e nos últimos anos tem vindo a concentrar-se em mãos cada vez mais escassas, seguindo a regra sempre útil herdada dos procedimentos dos apparatchicks do "eu nomeio-vos e vocês elegem-me " que foi instituída pelos novos Estatutos. O que é espantoso é que os seus confrades, se tomados isoladamente, continuam, na aparência, a ser pessoas de trato afável, com os quais se pode falar (mas com quem eu não me atrevo a ir além de assuntos triviais como o futebol com receio do que possa sair). Contudo, quando reunidos em conclave assumem colectivamente a posição que se costuma designar por "só sábios éramos dez ..." e dizem o que dizem, sai o que tem saído - que eu não qualifico para não ser indelicado. Esta é a perversidade que resulta do exercício cego do poder. Apesar disso - e não é de certeza devido ao trabalho dos órgãos directivos-sem sombra para dúvidas que a FEUP tem núcleos de excelência científica (quanto à didáctica eu ponho fundadas dúvidas) mas sabe, e se não sabe, não cumpre com o seu papel, que há área cinzentas que não chegam de modo nenhum aos padrões exigíveis. E quando factos lhe são denunciados, o senhor exerce o sempiterno veto de gaveta. Onde estão as respostas dos pedidos de abertura de inquérito que lhe foram enviados? Onde estão as respostas aos ofícios a que tem a obrigação de responder? É assim que zela pela qualidade?Já agora: não nota à sua volta um certo mal-estar ou acha que isso são apenas vozes maledicentes? Nunca reparou que há um número crescente de docentes que não se lhe reúne naqueles "imponentes" cortejos académicos, mesmo quando instados directamente a neles participar? Não lhe faz espécie o facto de não ter havido candidatos entre os não-docentes para as últimas eleições? Disso não retira nenhum sinal dos tempos? Foi eleito, foi, mas porquê? Algumas perguntas que merecem um pouco de meditação.Também deveria saber que tem a obrigação estrita de zelar pela possibilidade da expressão da diferença, pelo bem estar dos seus subordinados e pelos direitos e liberdades elementares dentro da sua Instituição e nisso falha vergonhosamente. Por isso eu lhe devo afirmar que como gestor de pessoal – e os recursos humanos são o bem mais precioso de uma Universidade – o senhor não temas qualidades mínimas exigíveis. E infelizmente isso não se passa por desleixo, mas por opção própria, por necessidade da protecção sistemática das estruturas, mesmo quando elas à evidência estão erradas e são de actuação perversa.E não venha tapar os problemas de insucesso escolar - que se têm de resolver de uma maneira séria e ponderada - com projectos "Soap" (os objectivos desse enorme esforço são muito pouco claros, para não dizer mais) quando há cenas de borracheira nas noites de quinta para sexta, com vomitados pelas escadas. E quando há vários meses se lhe exige a abertura de um inquérito sobre estes eventos, o senhor nem sequer responde. Acha mesmo que é assim que se promove a dignidade da instituição que superiormente dirige? Acha que não me sinto enojado por dar aulas numa instituição pública que se dá ao luxo de funcionar como o tasco da esquina ou será que a FEUP já tem alvará de bar nocturno e nós não sabemos? Senhor Director, alegro-me com os sucessos académicos dos meus pares e com o sucesso profissional dos alunos que se formam na FEUP como se fossem os meus.Por isso é meu dever combater as iniquidades com que me defronto todos os dias e é o que neste momento faço, dirigindo-me ao principal responsável da Instituição.Assumo de cabeça levantada uma posição de confronto e de discordância aberta,sem receio de mais um ou de vários processos disciplinares (venham eles) –pouco importa. Compreenda que apesar de tudo não o considero como inimigo pessoal, mas tão só como um superior (eleito ...) que não cumpre com os seus deveres como eu os entendo.Como já tive a oportunidade de lhe afirmar pessoalmente continuo a estar na disposição de reunir, em qualquer momento e em qualquer circunstância, com qualquer funcionário da FEUP, para e resolver as diferenças que nos possam separar , como também com o senhor. Contudo do lado oposto o eco é sempre nulo,como também o é da sua parte, porque a estrutura prefere à evidência o jogo subterrâneo (sabe muito bem que assim se podem praticar com maior sucesso na impunidade as arbitrariedades mais atrozes).É por isso que sempre que o encontrar no corredor continuarei a não estranhar que volte os olhos para o chão e recuse o meu cumprimento.
Atentamente e com votos de um 2006 mais digno
José Augusto Coelho da Rocha e Silva
Professor Associado da UP